Juan Guaidó durante discurso em Davos, na Suíça,
em 23 de janeiro de 2020. Foto: Denis Balibouse/Reuters
Em um ano como autoproclamado presidente interino, Guaidó enfrenta desgaste interno, e ONG identifica 12 táticas empregadas por regime comandado por Maduro para perseguir deputados e minar a oposição.
Juan Guaidó optou por um discurso em Davos, na Suíça para marcar a data de seu primeiro aniversário como autoproclamado presidente interino da Venezuela. Neste novo périplo fora do país, ele tentou mobilizar os líderes que participam do Fórum Econômico Mundial a aplicarem sanções mais rígidas contra o governo de Nicolás Maduro e a reprimir o comércio de ouro que ajuda, segundo ele, o governo a manter a lealdade dos militares e consolidar-se no cargo.
Proibido de deixar a Venezuela, a odisseia de Guaidó repercute no exterior, onde conta com apoio de 50 países, incluindo EUA, Brasil e os da União Europeia. Mas, internamente, seus apelos têm sido ineficientes para conquistar o objetivo de desbancar Maduro do poder.
Ao contrário, o líder da oposição enfrenta o desgaste, traduzido numa vertiginosa queda de popularidade, que desde janeiro passado despencou de 63% para 38,9%, de acordo com o instituto de pesquisas Datanálisis.
"Subestimamos a capacidade do regime de fazer o mal", justificou ele em Davos. Antes, esteve em Bogotá com o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo; em Londres, com o premiê britânico Boris Johnson; e em Bruxelas, com o chanceler da UE, Josep Borrell.
Ao longo do ano, Guaidó desafiou por diversas vezes o regime chavista: reuniu milhares de manifestantes em protestos, tentou, sem sucesso, fazer chegar ajuda humanitária à Venezuela e articulou uma ação militar frustrada numa base do governo. A capacidade de mobilizar multidões, no entanto, vem se dissipando.
Até agora, Maduro tem levado a melhor, ainda que no comando de um país alquebrado. O assédio à Assembleia Nacional presidida por Guaidó parece ser a última trincheira desta guerra. No início deste mês, deputados dissidentes se voltaram para Maduro e assumiram a direção do Legislativo, impedindo a entrada de Guaidó. A manobra foi rejeitada pela oposição, mas o impasse ainda persiste.
Tem sido assim desde a eleição do Parlamento de maioria opositora, em 2015. Um relatório da ONG venezuelana Centro de Justiça e Paz (Cepaz) identificou 12 táticas utilizadas pelo governo para perseguir deputados da oposição.
O resultado é simplesmente aterrador: em quatro anos, 59 legisladores foram vítimas de perseguição política, 28 perderam a imunidade parlamentar retirada; 14 tiveram seus passaportes cancelados sem processo. Cerca de 20% do total de deputados da Assembleia -- 33 e todos da oposição -- estão no exílio, na clandestinidade ou refugiados em embaixadas.
Em maio do ano passado, o deputado Edgar Zambrano -- braço direito de Guaidó e ex-vice-presidente do Parlamento -- passou mais de 100 horas desaparecido. Sem imunidade parlamentar, foi localizado na temida sede do Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin), em Caracas. Ficou 130 dias preso, acusado de traição à pátria e conspiração pelo levante militar em abril.
O suplente Gilber Caro enfrentou três detenções arbitrárias: em janeiro de 2017 esteve desaparecido durante 12 dias; em abril de 2019, por mais de um mês. Em 20 de dezembro passado foi novamente detido e seu paradeiro era desconhecido até semana passada, quando seu advogado teve acesso a ele, numa prisão venezuelana.
A abertura de processos em tribunais militares, a ameaça a familiares, a perda de direitos políticos, as invasões a residências e as agressões são instrumentos aplicados pelo governo Maduro para destruir por completo os vestígios da democracia na Venezuela, revela o relatório “A fórmula perfeita para reforçar a ditadura. Cerco à Assembleia Nacional da Venezuela”, do Cepaz.
Numa pesquisa realizada pela ONG entre os deputados, 88% dos entrevistados disseram ter sido perseguidos por forças de segurança do Estado, 73% sofreram agressões de milicianos sustentados pelo governo.
Enquanto encontrava líderes europeus, Guaidó denunciou que seu escritório era invadido por agentes da Sebin. E outro deputado desaparecia. Ismael León foi localizado na sede da Sebin e colocado em prisão domiciliar. Mas as acusações contra ele, segundo seu advogado, são desconhecidas.
Por Sandra Cohen
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