Recordando o pluralismo do Ocidente: Atenas, Roma e Jerusalém.

Perante o expansionismo autoritário chinês, precisamos hoje de recordar as âncoras pluralistas do Ocidente em Atenas, Roma e Jerusalém. O professor João Carlos Espada recomenda, a propósito, algumas leituras:

Inicio esta segunda tradicional crónica de livros para o Natal (de autores portugueses, depois da crónica anterior sobre autores estrangeiros) com duas excelentes obras memorialísticas, um género literário que é infelizmente raro entre nós. Refiro-me a No Devagar Depressa dos Tempos. Uma Antologia, de Marcello Duarte Mathias, (D. Quixote, 2019) e a Johnny Boy: Porto Anos 40 & 50 de João Van Zeller (Afrontamento, 2019).

Num registo diferente, menos pessoal, mas que ainda poderíamos talvez incluir no género memorialístico, temos Retratos Contemporâneos, por Manuel Braga da Cruz, (Aletheia, 2019). Depois da impressionante biografia de seu pai — Guilherme Braga da Cruz. Uma Biografia (1916-1977), Cruz Editores, 2018 — o autor reuniu agora em livro 56 textos sobre pessoas e instituições. É um magnífico livro de história contemporânea em que podemos recordar, entre muitos outros, Adérito Sedas Nunes, Maria Barroso, Mário Soares, D. José da Cruz Policarpo (a cuja memória o livro é dedicado) e João Paulo II, bem como a Sé Velha de Coimbra ou os Combatentes de Portugal.

Sobre temas contemporâneos, temos ainda A Europa e o Presente, de Teresa de Sousa (Público, 2019), reunindo 11 entrevistas da autora com europeístas marcantes, entre os quais me permito destacar Timothy Garton Ash e Jacques Rupnik. Carlos Gaspar acaba entretanto de publicar O Regresso da Anarquia: Os Estados Unidos, a Rússia, a China e a Ordem Internacional (Aletheia, 2019), uma reflexão muito actual sobre os desafios da presente (des)ordem internacional.

Manuel Braga da Cruz é também o coordenador, com António Vaz Pinto, s.j., de outro livro inspirador para este Natal: Francisco Suárez: Nos 400 Anos da Sua Morte (Universidade Católica Editora, Colecção IEP, 2019). Trata-se de uma colecção dos ensaios apresentados no colóquio promovido pelo Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica, que terminou com uma missa barroca na Igreja de S. Roque, junto à sepultura de Francisco Suárez.

São Tomás de Aquino e o Mercado: Para uma economia humana, de Mary L. Hirschfeld (Principia, 2019) é outro livro marcante na área da Teoria Política. Tal como o livro sobre Suarez, também esta obra recorda enfaticamente que a história da liberdade ocidental não começou com a revolução francesa de 1789 (nem, já agora, com o manifesto comunista de 1848). Lord Acton costumava dizer que Tomás de Aquino fora o primeiro pensador liberal.

Outro estimulante contributo para contrariar o preconceito de que a causa da liberdade se encontra exclusivamente à esquerda é a surpreendente colecção de ensaios coordenada por Miguel Morgado e Rui Ramos: Linhas Direitas: Cultura e Política à Direita (D. Quixote, 2019). Ainda que a dicotomia “direita vs esquerda” seja sobretudo herdeira da revolução francesa de 1789 (e praticamente ausente nas democracias parlamentares de língua inglesa), este é um contributo significativo para desafiar a autoritária aspiração monopolista da chamada esquerda na área da cultura e das ideias políticas.

O Esplendor da Liberdade no Enigma Conservador: Sobre a Teoria Política de Michael Oakeshott, de Carlos Marques de Almeida (Almedina, 2019) é outro significativo contributo, estritamente académico, para abrir os horizontes da nossa cultura política — que foi durante demasiado tempo dominada pela infeliz dicotomia entre direita autoritária e esquerda autoritária. Michael Oakeshott enfaticamente desafiou os preconceitos autoritários, de direita ou de esquerda, e reclamou para a conversação liberal-conservadora de língua inglesa uma âncora segura da tradição ocidental da liberdade.

E a liberdade ocidental enfaticamente precisa hoje de redescobrir a(s) sua(s) âncora(s) segura(s). Para além da espuma provisória das infelizes dicotomias — entre esquerda e direita, cosmopolitismo e nacionalismo, razão e fé — a nossa civilização ocidental da liberdade sob a lei enfrenta hoje uma ameaça da maior gravidade: o expansionismo totalitário chinês. Precisamos por isso de recordar as âncoras pluralistas do Ocidente em Atenas, Roma e Jerusalém. Esse é o tema de um pequeno grande livro de Samuel Gregg, Reason, Faith and the Struggle for Western Civilization (Regnery, 2019).

Feliz Natal e boas leituras.




(SBT Novelas)

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